29 de Setembro de 1864 - 29 de Setembro de 2014
A 29 de Setembro de 1864, José da Silva Mendes Leal e Facundo Goñi, Plenipotenciários respectivamente do Rei Luís I de Portugal e da Rainha Isabel II de Espanha assinam, no Palácio da Ajuda, "um tratado de limites dos dois reinos desde a foz do Rio Minho até à confluência do Rio Caia com o Guadiana".
O Tratado que se celebra " tendo em consideração o estado de desassocego em que se encontram muitos povos situados nos confins de ambos os reinos" é pioneiro numa Europa ainda em maior "desassocego", cujo mapa político mudará com frequência dramática nos 150 anos de vida que leva este Tratado. O cuidado com que foi preparado revela-se também na existência de um Anexo, o "Regulamento sobre os rios limitrofes", preocupação percursora de gestão política de recursos naturais partilhados, antecipando aquilo que poderão ser as futuras questões mais relevantes das relações entre os dois países.
O acordo sobre os limites territoriais só é aceite até ao Rio Caia, sobrepondo, assim, o entendimento com a Espanha em favor do sossego das populações e do interesse público, à solução da questão política da devolução do território de Olivença, cuja restituição a Portugal fora reconhecida pelo Congresso de Viena em 1815, ratificada por Espanha em 1817 e que continuava por concretizar. Mais tarde, circundando mais uma vez a questão de Olivença, a delimitação da fronteira das províncias do Alentejo e do Algarve, " da desembocadura do Rio Cuncos à do Guadiana", será concretizada pelo Convénio de Limites de 1926.
Logo na primeira dinastia, com excepção do Algarve ainda em poder mouro, foram acordadas as fronteiras entre Portugal e Leão e Castela, cujos ajustamentos através dos séculos não são significativos. Os acordos sobre os limites começaram, nalguns casos, por ser estabelecidos pela posse das terras de grandes casas nobres, de um e outro lado da fronteira, mas cedo foram reconhecidos por Tratados entre as Coroas, como o Tratado de Badajoz de 16 Fev. 1267 (entre D. Afonso III e Afonso X de Castela) e o famoso Tratado de Alcanizes de 12 Set. 1297, celebrado pelo Rei D.Dinis.
Se no plano político existia consenso sobre a linha de fronteira, a nível local havia "desassocego" causado por disputas, agravadas por interesses e indefinições sobre a sua demarcação concreta e reconhecível. A negociação do Tratado de 1864 é, por isso, precedida, em Portugal e Espanha, de cuidadosos estudos e levantamentos cartográficos, sendo as situações mais melindrosas directamente comunicados ao Rei, na altura D.Pedro V. É riquíssimo o acervo documental do Arquivo do Ministério dos Negócios Estrangeiros relativo a este processo, aberto à atenção dos historiadores.
Produto de grande rigor, realismo e visão política, 150 anos decorridos o Tratado mantém toda a sua actualidade como quadro base das nossas relações com Espanha, requerendo estas, necessariamente, novas respostas em domínios que na época eram impossíveis de antever.
Embaixador Rui Aleixo